domingo, 16 de novembro de 2008

Caminhos e pontes para o diálogo (3)

VALOR – Esses diagnósticos não servem apenas para orientar a comunicação, mas podem alterar o próprio negócio?

OLINTA – Exato. A comunidade tem muito a contribuir e ela reorienta, sim, a forma e atuação a empresa.

RODRIGUES – A empresa tem de abrir porta e janela para todo lado, senão está morta. Quem faz isso hoje é a área de comunicação. Na CPFL, a cada 15 dias a gente leva para um almoço com a diretoria uma pessoa que discorre sobre o problema o vizinho, por exemplo.

ELISA – A comunicação era numa direção só, agora é um diálogo. A empresa se reorganiza diante dessas opiniões externas.

RODRIGUES – O mundo mudou e os vínculos não são mais verticais. Todos querem se comunicar, só que, quando se comunicam à maneira antiga, dando ordens, já não funciona, porque agora os vínculos são horizontais. E como é que se faz comunicação horizontal sem autoridade? É preciso persuadir, e não dar ordens. Isso muda tudo. Isso nos coloca no centro do mundo em toas as empresas.

MALU – É a rede trazendo demandas. A gente tem que saber ouvir.

RODRIGUES – Os jovens executivos não estão ligando para a carreira, eles querem vencer rapidamente, A tal a lealdade organizacional é coisa da década de 60. Agora nós estamos casados com áreas de RH para montar projetos de como oferecer valores a esses meninos, valores que possam colocar no mesmo barco os velhos e os novos, os gaúchos e os paulistas.

CARNEIRO – Numa empresa como a Petrobras, a resiliência de imagem é muito elevada. A descoberta do pré-sal, por exemplo, é um baita desafio para a Petrobras, e os públicos estão acompanhando esse desafio junto com a empresa. É possível que haja questionamentos, mas o investidor tem uma confiança tão grande na empresa que o possível impacto da aparente indefinição sobre esse tema é diluído ao longo o tempo pela reputação da Petrobras, pó essa franquia que a empresa tem de simpatia, de confiança e de admiração. À comunicação resta potencializar esses ativos com os 13 públicos que temos mapeados e há, no momento, um trabalho articulado de deixar claro para todos esses públicos, sejam investidores, sejam organizações não-governamentais, o que são essas reservas e o que elas representam.

VALOR – Quanto da gerência da marca envolve também fazer política? Parece que a Araracruz faz isso no caso do sul da Bahia, por exemplo.

BRANDÃO – Eu vou aproveitar essa pergunta para tratar das empresas que têm muita exposição no exterior, nesse Brasil novo, e as que agora estão se posicionando fora do Brasil. A hora é nossa. Aquela hegemonia de sempre do Hemisfério Norte está seno desafiada. Nesse contexto, uma das coisas de que a Araracruz às vezes sente falta e outra empresas virão a sentir é de mais conhecimento sobre o Brasil em mercados exigentes. Existe um conhecimento do folclore e um desconhecimento muito grande do dilema que é um país deste tamanho, com tanto recurso natural, com tantas empresas grandes bem posicionadas e com tantas desigualdades. Como explicar as carências que regiões como o extremo sul da Bahia ainda tem em pleno século XXI? Para um europeu ou um americano, muitas vezes a ignorância do que significa o Brasil o torna muito mais sensível a informações que chegam um pouco enviesadas. Se não tomarmos cuidado, com as melhores intenções, nós mesmos, os brasileiros, vamos dar um tiro no pé as nossas empresas e prestar um serviço à concorrência internacional. Do lado de lá existem lobbies, indústrias tradicionais que estão ameaçadas, sindicatos de trabalhadores muito bem estruturados – e todos não vão ficar quietinhos vendo um país chamado Brasil começar a tomar espaços muito grandes.

VALOR – Mas fazer parte do índice de Sustentabilidade da Sow Jones, como a Araracruz faz, não ajuda a compor uma boa reputação?

BRANDÃO – Cria um colchonete e reputação, não cria o colchão que a Petrobras tem, e é um índice do qual você pode sair no ano seguinte. Somos a única empresa do mundo que tem esse índice na área florestal, mas isso é pouco, isso fala com pessoas como nós, nossos fornecedores, nossos clientes, nossos investidores. Mas o público mais importante, hoje, para empresas como a Araracruz, é aquele público crítico, quase sempre o terceiro setor.

LAGE – A área de comunicação tem, de fato, assumido papéis relevantes na discussão de temas transversais na empresa. Mas ela não faz isso sozinha – nem pode. Quando a comunicação cresce muito, ela também precisa ter credibilidade dentro a corporação, entre pares, Até pouco tempo atrás, não tinha, era simplesmente uma área técnica, de suporte. Hoje, a atividade de comunicação extrapola para toas as áreas da empresa, que precisam entender que o processo de comunicação não é meramente técnico, mas ocorre em todos os momentos, na rotina da organização. Dessa forma, todos podem contribuir. E o comunicador passa a ter um papel e articulador político.

ELISA – No fundo, os funcionários formam a opinião da empresa. Cada vez mais há encontros internos com todos os funcionários, não só da liderança, mas também do chão de fábrica, para explicar exatamente onde a empresa quer chegar e fazer com que essas pessoas também ajudem a vender e promover o crescimento os negócios.

MALU – Até porque comunicação “interna” não existe. Tanto o público interno como todos os outros públicos estão cada vez mais críticos, conhecendo cada vez mais o negócio, esperando cada vez mais respostas – e toas essas comunidades conversam entre si. No nosso caso, são 60 mil funcionários, 60 mil críticos potenciais que vão falar em comunicação “interna”.

OLINTA – Há uma mudança no perfil dos gestores também. Hoje, a empresa busca gestores qualificados para lidar com comunicação, ao mesmo tempo em que prepara os gestores que têm e cuja formação não incluiu essa atribuição que hoje lhes é cobrada. O gestor, agora, é responsável pela imagem e pela reputação da empresa, pelas questões ambientais no geral, independentemente a função em que está, e é responsável da mesma forma pelas relações com a comunidade, com a imprensa, com os empregados.

POLIDORO – De fato, são os gestores que estão lá na ponta que sabem quais são os problemas. Nossa palavra de ordem, hoje, é confiança. A perda ou a manutenção da confiança da sociedade é que vai fazer com que o negócio seja bem-sucedido ou não, e a confiança é preservada pela boa prática e pela boa comunicação. O gestor deve compreender esse processo. Se ele não compreende, proliferam os mitos. Toda empresa se defronta com alguém preparado para criar um mito em torno deles. Há mitos na área de infra-estrutura, que é a nossa, a Araracruz enfrenta seus mitos, a Vale tem o mito da privatização... Há gente trabalhando para preservar esses mitos. Só o gestor que está lá, convivendo com isso no dia-a-dia, saberá como reagir. Se ele precisar de um apoio especializado, ele nos chama. Mas ele deve ter competência para entender o que se passa.

VALOR – Como é que a empresa se assegura de que o gestor que está na ponta terá essa competência?

OLINTA – Capacitação e, mais do que isso, discussão local. Por exemplo, os diagnósticos de que falei não são feitos pela comunicação, mas pela Fundação Vale. Eu leio esses diagnósticos e discuto sob a ótica da comunicação, e o gestor operacional faz a mesma coisa aplicada à sua área, o que não acontecia no passado recente, quando as questões relacionais não era atribuição os executivos. Hoje, são.


Fonte: Revista Valor Setorial - Comunicação Corporativa, outubro 2008. Disponível em http://208.96.41.18/valoreconomico/home.aspx?pub=27&edicao=1, acesso em 20 out 2008.

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